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Desabafos da Mula

Desabafos do quotidiano, por vezes irritados, por vezes enfadonhos, mas sempre desabafos.

Desabafos da Mula

Da tua ausência #9

Um ano...

 

Já passou um ano!

 

Há um ano era Carnaval e tu num momento estavas a brincar connosco na mesa da cozinha, e de repente estavas estendido no chão imóvel. Lembro-me como achei que ainda respiravas, lembro-me como nunca me passou pela cabeça sair de casa contigo e chegar a casa em ti!

 

Há um ano eu não trabalhei o dia todo, estava só a fazer meio dia, nunca gostei de máscaras, nunca poderia trabalhar o dia inteiro numa rua movimentada num dia como este. E se não fosse Carnaval e eu não tivesse saído cedo? Se não fosse Carnaval e eu não tivesse saído cedo provavelmente não me teria despedido de ti, ou talvez simplesmente te encontrasse gelado ali mesmo onde definhaste por alguns segundos. Ou terão sido horas? Acho que naqueles instantes perdi a noção do tempo, eu só corri para te colocar na transportadora e no carro tão rápido quanto me foi possível, mas fui lenta, demasiado lenta, demasiado lenta para ti. Foi fatal a minha lentidão. Acho que nunca me perdoei por não ter encontrado uma solução melhor, um vet mais perto teria dado jeito, fui escolher justamente um que ficava tão longe. Um dos melhores disseram-me em tempos. Só que um dos melhores ficava demasiado longe, ficou demasiado longe. Verdade é que também não consegui encontrar um mais perto aberto. Lidam com o Carnaval como se fosse feriado, tudo fecha. Dizem nas televisões que nem feriado é. Maldito Carnaval, nunca gostei, não tinha motivos, mas nunca gostei. Agora tenho todos os motivos do mundo. O Carnaval levou-te para longe de mim. Foi o karma talvez: Comecei o dia a rir por estar a chover e não estar propício a foliões, acabei o dia a chorar... ou terá sido o mês? Uma vez mais, acho que perdi noção dos dias, foi uma facada demasiado forte, demasiado grande.

 

Desde então que sinto a tua falta. A tua ausência custa-me horrores, ainda pra mais agora que estou desempregada e que tinha todo o tempo do mundo para ti e tu acalmavas-me tanto, tanto, tanto. Podia ter tantos problemas mas quando chegava a casa e te pegava ao colo todos os problemas ficavam mais pequeninos, o teu ronronar tinha uma capacidade calmante como nunca. Lembras-te quando adormecia agarrada a ti? E tu ficavas ali tão sossegadinho para não me acordar? Sempre tiveste uma sensibilidade especial para perceberes quando podias ser tu o carente, ou quando precisava eu de o ser...

 

Um ano...

 

Ias adorar os novos cortinados da sala. Tu adoravas esconderes-te atrás deles e atacares os nossos pés quando passávamos. 

 

Até a lareira não tem o mesmo encanto, não estás ali colado quando está acesa.

 

Um ano...

 

Às vezes leio histórias de gatos e cães que regressam a casa anos e anos depois, sempre me perguntei como é que as pessoas tinham a certeza e a garantia que aqueles animais eram realmente os que se perderam e desapareceram anos antes, sempre me perguntei se não seria um desejo inconsciente que os fazia crer sem reservas. Que estupidez! Eu reconhecer-te-ia numa multidão de gatos. Gatos pretos e brancos há muitos, mas como tu, não há nenhum! Tinhas um miar irritante, muito irritante, eras conhecido por não saber miar, e às vezes tenho medo de me esquecer de como miavas, a que soava. Até disso eu sinto falta. E dos sobressaltos à  janela, e dos pedaços de frango roubados e da forma como nos mostravas que não querias brincar.

 

Disseram-me que o tempo ia curar esta dor, que eu ia ultrapassar e até quase que ouvi pessoas a dizer que ia esquecer e tudo iria fazer parte do passado... Mentiras! Apenas mentiras! Não passou!

 

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Fazes-me falta!

 

Desabafos do quotidiano, por vezes irritados, por vezes enfadonhos, mas sempre desabafos. Mais do que um blog, são pedaços de uma vida.