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Desabafos da Mula

Desabafos do quotidiano, por vezes irritados, por vezes enfadonhos, mas sempre desabafos.

Desabafos da Mula

Fatia Mor, conta-me histórias da música que eu ouvi!

O grande objetivo desta rubrica é, essencialmente, desconstruir ideias pré-concebidas acerca das músicas, perceber que uma música é muito mais do que o que se ouve, que tal como Camões e Pessoa nas suas poesias, nem sempre um poema é objetivo, direto e totalmente percetível. É isso que as minhas convidadas vos têm demonstrado, e prometem continuar a demonstrar.

 

São loucas, dirão alguns.

 

Perspicazes, digo eu!

 

A minha convidada de hoje, Fatia Mor, traz-nos hoje mais uma história inédita, nunca antes contada, mas não menos verdadeira, sobre a Canção do Mar, imortalizada na voz da nossa Dulce Pontes, apesar de ser original de Amália Rodrigues.

 

Tão enganadinhos que temos andando... Só vos digo isto: Tão enganadinhos!

 

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Ora bem, hoje escrevo-vos sobre a música Canção do Mar. Interpretada originalmente pela Amália Rodrigues e popularizada pela Dulce Pontes, conta a história de uma pobre rapariga enamorada por um amor proibido... Mas será mesmo?

 

A verdade é que esta canção conta a história de uma pobre criatura, com vontade de ser stripper num bar pouco recomendável a senhoras de bem, com alucinações recorrentes sobre um mar que fala.

 

 

Vejamos:

 

Fui bailar no meu batel

Além do mar cruel

 

Aqui está o primeiro indício. Para quem conhece bem a zona costeira, sabe perfeitamente que há n casas de strip e alterne de nome Batel. A moçoila está tão empenhada neste estilo de vida que até o trata carinhosamente de “meu batel”.

 

Ela quer seguir um estilo de vida próprio e diz que foi bailar. Aqui claramente encontra-se um nome de código para tirar a roupa.

 

Além do mar cruel é uma referência à dificuldade em despir-se pela primeira vez em frente àquelas pessoas todas, que terá despoletado um episódio psicótico, porque logo a seguir…

 

E o mar bramindo

Diz que eu fui roubar

 

…diz que o mar fala! Como todos sabemos, o mar enrola na areia e pouco mais. Muito menos, não anda por aí a bramir e a levantar falsos testemunhos sobre generalidades. Mas o sentimento de culpa e a ambivalência entre querer ser uma stripper e o julgamento da sociedade, a nossa pobre criatura vê-se a mãos com uma descompensação com delírios auditivos.

 

A luz sem par

Do teu olhar tão lindo

 

Ao que parece, o mar não se limita a julgá-la mas ainda faz referência a uma pessoa em particular. Soubesse ela que a luz do olhar é apenas o néon que dá nos olhinhos do pessoal que se senta mesmo em frente ao palco e, enquanto ela rodopia no varão, lhe parecem de uma beleza e deslumbramento sem par.

 

Mas no fundo ela sabe disso e isto é apenas uma estratégia de angariação de clientes, que é como quem diz “oh lindo, anda cá!”. O problema é que desde que o piropo foi proibido, a malta teve que arranjar maneira de disfarçar a coisa, mulheres incluídas a bem da igualdade de direitos e oportunidades!

 

Vem saber se o mar terá razão

Vem cá ver bailar meu coração

 

Ora, aqui estamos a avançar na carreira. Ela acaba por dar continuidade ao trabalho, e tenta angariar os clientes para uma table dance privada. No fundo, ela quer que eles vão “bailar” com ela. O mar continua no tema central do seu delírio auditivo e ela quer saber se ele terá razão, ou não, em julgá-la. A malta acha a coisa estranha mas a verdade é que o estranho é atraente e lá vão eles ao baile!

 

Se eu bailar no meu batel

Não vou ao mar cruel

 

E agora tenta justificar-se perante a sociedade. É que se ela for bailar, não tem que ir ao mar cruel. Portanto, podemos subentender que o rendimento auferido no Batel é de elevada quantia, não havendo necessidade de ir bater com os costados num trabalho mal pago. Para além disso, percebe que não tem que dar justificações quaisquer ao mar, que na verdade é a vizinha da frente, que espreita sempre pela fechadura da porta quando ela chega a casa, às tantas da madrugada.

 

E nem lhe digo aonde eu fui cantar

Sorrir, bailar, viver, sonhar contigo

 

E cá está. Depois de vender a ilusão, no varão do Batel, a criatura fecha-se em copas, que apesar de tirar a roupa, ainda é uma criatura de respeito. Portanto, ela não diz onde foi cantar, nem sorrir, nem bailar, nem nada do que lhes prometeu. Aquilo fica-se só por ali e acabou.

 

Há que manter o mistério, para o negócio florescer.

 

Parece que aqui ela já atinou do juízo e o melhor será mesmo mudar de casa, para um condomínio privado, com piscina e guarda noturno para não ter que levar com a vizinha.»

 

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E tendo em conta os rendimentos, tenho cá para mim que não será nada complicado de sustentar esse condomínio privado com tudo e tudo e tudo!

 

Mas digo-vos, meus caros, que estou até um pouco chocada, confesso,  é que realmente o que não falta por aí são bordéis de nome Batel, e já se sabe que para se aguentar muito do que por lá se passa, há também algumas drogas à mistura que... Justifica muita coisa, acreditem, justifica muita coisa, essencialmente o mar falar e julgar e... enfim, meus queridos, assim é a vida e cada um tem que fazer pela sua...

 

Uma coisa vos garanto, nunca esta música há-de ser ouvida da mesma maneira, obrigada Fatia Mor por isso!

 

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Têm uma história engraçada sobre uma música e gostariam de a partilhar connosco? Mandem a vossa história para desabafosdamula@hotmail.com e a história será partilhada aqui nos Desabafos da Mula assim que possível.

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