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Desabafos da Mula

Desabafos do quotidiano, por vezes irritados, por vezes enfadonhos, mas sempre desabafos.

Desabafos da Mula

Quem conta um conto... #4 O amor é eterno, as pessoas é que não!

E hoje, saiu mais um conto aqui para o cantinho da Mula...

Porque hoje estou muito amor, sai mais uma história de amor para a mesa 5, se faz favor! 

 

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Tina e Filipe passaram toda a sua vida juntos. Casaram-se aos 18 anos, aos 19 já tinham um filho, e foram sempre, muito unidos. Tinham os seus desentendimentos, é claro, mas quem não os tem? Contrariamente ao que é tomado por referência, na sociedade portuguesa, Tina e Filipe, eram um casal diferente, muito modernos para o seu tempo. Era Tina quem conduzia - Filipe nem tirou a carta, nunca foi necessário -, era Tina, quem geria a casa e as finanças, quem geria as propriedades que ambos possuíam. Filipe embora não gerindo, segui-a para todo o lado, mas a última palavra era sempre de Tina. Amavam-se e eram assim, felizes!

 

Tina e Filipe eram muito diferentes um do outro, e talvez por isso, fossem um casal tão equilibrado. Ela era alegre e muito faladora. Ajudava sempre quem mais precisava e sempre fora um ponto de referência entre a vizinhança. Não era de guardar rancores, ou más recordações, dizia que "o que lá vai, lá vai", sempre com um sorriso no rosto, pronto a receber quem estivesse disposto a entrar. Era desbocada, dizia muitos palavrões, mas alegrava todos por onde passava. Tina tinha uma saúde de ferro, nunca se deixara ficar doente, pelo menos, nunca a viram doente. "Uma guerreira" diziam quem a conhecia. Sempre gostaram dela, tal como ela era.

 

Ele era o seu oposto. Muito reservado, pouco falador, mas apreciador de umas boas piadas, talvez por isso amasse tanto Tina, sabia que a seu lado nunca ficaria triste. Filipe era sincero, muito acarinhado pelos amigos. Um amante de música clássica e de bons livros, gostava do seu sossego e de estar em silêncio. À medida que fora envelhecendo, Filipe foi ficando muito doente, de uns anos para cá, passava mais tempo no hospital que na própria casa. Tinha um problema respiratório crónico e não havia muito a fazer. Mas nem a doença lhe tirou a vontade de viver. Continuou a ser quem sempre fora, a fazer as mesmas coisas, todos os dias da sua vida, não como se fosse o último, mas como quem ama a vida. Nunca pensara muito nos últimos dias da vida. Era um optimista irremediável. Nunca o viram infeliz, triste ou com um ar mais pesaroso.

 

Ao fim de 40 anos juntos, a vida deles, enquanto casal, chegou ao fim. Filipe morre e deixa Tina em terra penando pela sua ausência. E já se sabe, quando existe um amor assim, quem vai, leva a alma de quem cá fica. Mas Filipe levou consigo, muito mais que a alma de Tina. Filipe Levou-lhe a sua alegria, a sua vontade de viver, a sua sanidade mental, e desde então que não existiu um único dia, que Tina não chorasse a sua morte.

 

Meses mais tarde, Tina morreu de tristeza, porque a tristeza também mata. Há quem diga que nessa noite, o céu ficou mais estrelado, e a lua mais brilhante. Dizem que alguém, num outro lado, num outro mundo, reencontrou quem tanto procurava...

 

Eu não sei se é verdade... mas acredito em finais felizes!

Desabafos do quotidiano, por vezes irritados, por vezes enfadonhos, mas sempre desabafos. Mais do que um blog, são pedaços de uma vida.