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Desabafos da Mula

Desabafos do quotidiano, por vezes irritados, por vezes enfadonhos, mas sempre desabafos.

Desabafos da Mula

Em estado de choque

Não sou de comentar a atualidade. Este blog não é sobre isso, mas há coisas que me chocam... Por isso não vejam esta publicação como um comentário a uma notícia, mas antes como uma reação chocada à notícia.

 

Estou chocada...

 

Quando achamos que já vimos tudo aparecem estas notícias em rodapé para nos lembrar que há muito mais nesta vida para ver.

 

Para quem não viu/leu e não lhe apetece clicar ali no link para ler, eis um curto resumo: Uma criança de 9 anos diz que é homossexual e suicida-se 4 dias depois.

 

Primeira reação: 

Mas o que é a sexualidade/heterossexualidade/bissexualidade para uma criança de 9 anos? O que é que uma criança sabe de si com 9 anos?

 

A identidade sexual para mim forma-se na adolescência, e uma criança com 9 anos à partida não é adolescente. Para mim a orientação sexual está relacionada com sentimentos e pensamentos eróticos, relativos a sexo, e não a sentimentos de amizade ou de brincadeira.

 

Uma criança do sexo masculino com 9 anos que calça os sapatos da mãe e veste as suas roupas e quer pôr unhas postiças não é homossexual - pode ser, mas não é isso que irá definir a sua sexualidade. Uma criança do sexo masculino com 9 anos que calça os sapatos da mãe e veste as suas roupas e quer pôr unhas postiças é uma criança a praticar o tão famoso role-play. Está a experimentar. Faz parte. Claro que pode já existir algum tipo de tendência ou afinidade perante um determinado sexo, mas não há uma definição sexual definitiva da criança. Da mesma forma que uma menina de 9 anos que ande atrás de rapazes para lhes dar beijos na boca, não tem de ser heterossexual.

 

Freud é bem capaz de estar a remoer-se na tumba por isto que eu aqui escrevo, mas é realmente a minha forma de ver. Para mim uma criança é assexuada, torna-se um ser sexual quando efetivamente alcança a puberdade e consecutivamente a adolescência. Não é isso que a irá definir.

 

Parece-me, por isso, que há aqui uma grande falha parental no que toda a explicar à criança o que é ser um ser sexual, não sei o que aconteceu porque não estive, obviamente, presente mas o que diz na notícia é que a mãe "apesar de ter começado por achar que o filho estava a brincar, acabou por perceber que não era o caso e disse-lhe que o amava" [in Visão

 

Parece-me bem dizer que se ama a criança, passa a ideia, tal como deve ser, que cada um tem o direito de escolher o que quer ser, e que cada um deve viver de acordo com o que sente, sem medos ou receios. Mas creio que aqui faltou a parte do "ora vamos lá então conversar sobre isso, o que é para ti ser gay". Uma vez mais refiro, isto pode ter acontecido, baseio-me apenas na notícia.

 

 

Segunda reação:

Mas o que caralho sabem as outras crianças sobre o que é ser homossexual ou heterossexual para fazerem bullying ao ponto de uma criança - UMA CRIANÇA! JÁ VOS DISSE QUE FOI UMA CRIANÇA? - de 9 anos se matar... Claramente culpa dos adultos que os rodeiam que incutem que A, B ou C é errado, apesar de os maiores errados serem os próprios. Se eu educar o meu filho a dizer que um judeu - foi o que me ocorreu agora, tá? - é mau, filho meu vai repetir que um judeu é mau. Se eu incutir o ódio no meu filho, o meu filho vai passar a odiar um judeu. Mas... e o que é um judeu para o meu filho? Não faz ideia... O mesmo aqui se passou. Da mesma forma que uma criança não sabe para si o que é a sexualidade e qual a sua orientação os amigos da sua idade também não saberão, agora... repetem os comportamentos dos adultos, pois claro!

 

 

Terceira reação:

A mesma notícia termina com "A escola adianta que tomou medidas extraordinárias para ajudar os alunos a lidar com a morte do colega."  [in Visão]  Medidas para ajudar os alunos a lidar com a morte do colega? E medidas para combater esta criminalidade em tenra idade? E que medidas são tomadas para isto não se repetir, seja nos Estados Unidos, seja em Portugal, seja na China? Os pais dessas crianças não são responsabilizados?

 

 

 

É quando vejo estas notícias que o meu útero se amarfanha, encolhe e diz baixinho: É melhor não pormos nenhuma criança neste mundo, que este mundo não é bom para as crianças!

Parem, por favor!

A propósito desta notícia posso por favor pedir uma coisa?

 

Deixem as mulheres em paz!

 

Parem com a vitimização por favor! Nunca ser mulher me deu tanta vergonha. Parece que somos umas coitadinhas... Se fazem publicidade com homens é uma publicidade sexista. Se fazem publicidade com mulheres cai o Carmo e a Trindade porque estamos a ser acusadas disto e daquilo... Parece que somos feitas de cristal e que não podem tão pouco olhar para nós porque isso nos pode ofender!

 

Sou mulher e estou a sentir-me ofendida com este exagero que se está a gerar em torno do que é ser homem e o que é ser mulher.

 

Preocupem-se antes com as crianças que são diariamente maltratadas, com os sem-abrigo que diariamente passam fome e frio, com as famílias que devido ao desemprego têm de fazer o milagre da multiplicação para poderem colocar comida na mesa. E se se quiserem realmente preocupar com as mulheres, então preocupem-se com aquelas que apanham dos maridos diariamente, mas já agora preocupem-se também com todos os homens que são vítimas de violências várias, em vez de os chamarem de choninhas. Preocupem-se ainda com as filas de espera exageradas nos hospitais. E se tudo isto ainda for pouco, preocupem-se com os salários miseráveis e com a burocracia que nos dificulta diariamente as pernas. Há tanto com que nos preocuparmos... 

 

Desde quando somos assim tão sensíveis que nos melindramos com tudo? Desde quando nos tornamos tão pucuinhas e obsessivas? Desde quando passamos a ter tão poucos problemas para nos debruçarmos sobre meros pormenores, que nem isso são? Vá lá, é só uma publicidade antitabágica com o propósito de chocar para chamar a atenção. Cumpre o pressuposto... E eu nunca vi nenhum homem ofendido por aparecer numa cadeira de rodas nas campanhas de prevenção rodoviária... Não é também sexista e ofensivo ser sempre o homem associado ao álcool? É que eu conheço alguns homens que não bebem e mulheres que parecem esponjas - eu inclusive. 

 

Que é feito da nossa liberdade criativa? Aliás... Que é feito da nossa liberdade no geral?

 

O exagero agora é tanto que até me admiro que ainda ninguém tenha caído em cima das marcas de detergentes por aparecerem sempre mulheres... Ah! Deve ser por estar equilibrado por o moço do Surf estar nu na publicidade... Tem sorte que é homem, se fosse uma mulher nua, nem que a publicidade fosse pensada por outra mulher, já era exploração do corpo e da imagem das mulheres, porque somos vistas como um pedaço de carne e bla bla bla pardais ao ninho... Os homens, é por amor à arte! Oh vá lá! 

 

Sou mulher, e como mulher peço: mulheres, deixem as mulheres em paz! Estou farta! 

Carta aberta aos pais dos tempos modernos

Queridos pais dos tempos modernos:

 

Bem sei que no vosso tempo também ouviram que pertenciam à geração rasca. Os mais novos são sempre a geração rasca. Mas nem a consciência que sempre assim será, vos deve impedir de fazerem o melhor pela educação dos vossos filhos. Bem sei que o tempo é curto, que se passarem o pouco tempo que vos resta a discutirem com os vossos filhos, que não conseguirão estreitar os laços, que já são tão curtos, mas permitir-lhes fazer tudo o que lhes apetecer, só porque educar dá trabalho e é preciso tempo, não os vai ajudar na travessia até à vida adulta.

 

Não, não é preciso bater. Não, não é preciso berrar. Mas sim é preciso dizer não de quando em vez. É preciso dizer não muitas vezes, na realidade. E se vos disserem que não estão a ser justos, o velho cliché que a vida por si só é injusta, é sempre uma boa resposta.

 

Bem sei que não sou mãe, que na realidade não percebo nada disto. Mas ainda sei ver, enquanto educadora, enquanto profissional, que alguma coisa está a correr mal na forma como os jovens de hoje agem nos dias que correm, seja na ausência ou na presença de adultos.

 

Bem sei que ser rebelde faz parte da travessia. Eu também o fui. Também fiz as minhas asneiras. Também fumei o que tinha a fumar. Também bebi o que tinha de beber. Também gozei o que tinha de gozar. Mas sabem o que nunca fiz? Nunca faltei ao respeito de nenhum adulto, nunca estraguei propositadamente o que não é meu, nunca estraguei as férias de ninguém. Sabem o que os meus pais nunca fizeram? Nunca me deram palmadinhas nas costas quando errava, sempre me obrigaram a assumir as consequências. Obrigaram-me a pedir desculpa quando ofendia alguém, ou quando era simplesmente mais refilona. Obrigaram-me a arrumar, quando desarrumava o que não era para desarrumar. Obrigaram-me a limpar, quando sujava o que não era para sujar. Obrigaram-me a crescer, mostrando-me que a vida adulta não era tudo perfeito e tudo de minha feição.

 

Não tive pais perfeitos. Não há pais perfeitos. Mas tive pais que me souberem dizer não as vezes que foram precisas, que me fizeram espernear as vezes que foram precisas, e sim, que me bateram as vezes que foram precisas para eu aprender que há coisas que não se dizem, que há coisas que não se fazem. E choquem-se: não me traumatizo por isso. Mas concordo que não é preciso bater para educar e que há múltiplas escolhas e formas de ser e estar com os vossos filhos que vocês podem optar neste mundo louco que é a educação dos jovens. Mas uma coisa é certa. Façam como quiserem, mas eduquem-os de uma forma diferente, que como está, não está a correr bem.

 

Queridos pais dos tempos modernos, lamento desiludir-vos, mas os vossos filhos não precisam apenas de um teto, comida, roupa lavada e gadgets. Não precisam apenas de sapatilhas de marca e telemóveis topos de gama. Não precisam que os compreendam apenas. Lamento desiludir-vos mas contrariar os filhos faz parte, ouvir dos filhos o quanto são odiados por os contrariarem, faz parte. Que ouvir as portas dos quartos deles bater com força, faz parte. Porque perceber que as coisas não são sempre como nós queremos e gostamos, também faz parte.

 

Porque, queridos pais dos tempos modernos, os filhos de hoje são os pais de amanhã, e se isto assim continuar eu não sei como será o mundo de amanhã mas fico com medo de viver nele.

 

Grata pela atenção,

Mula

Desabafos do quotidiano, por vezes irritados, por vezes enfadonhos, mas sempre desabafos. Mais do que um blog, são pedaços de uma vida.