Fingimento
Estou farta de fingir. De sorrir quando me apetece chorar. De parecer bem e tranquila para tranquilizar os outros, quando apenas me apetece gritar e bater com as mãos e cabeça na parede. Finjo pelos outros, mas também por mim, porque não quero ter de me explicar, de abrir o livro da minha vida que tanto quero fechar.
Finjo e luto contra mim e contra as minhas emoções e afinal descubro que sou má a fingir. Tanto para tão pouco.
Percebemos que somos muito maus a fingir quando alguém que mal conhecemos, com quem não falamos propriamente para além do normal "bom dia" e "até amanhã" nos pergunta o que se passa e que diz não acreditar quando dizemos que está tudo bem.
"Sinto que perdeste a tua alegria!" Disse-me uma moça que nem é minha colega, trabalha numa outra empresa aqui do edifício. É das pessoas com que me cruzo, não das que fico para conversar. E eu acho que continuo a agir normalmente. Pelos vistos não. Odeio ser tão transparente.
E se às vezes penso que me deveria de dar à tristeza, e me deixar cair para fazer os meus lutos, a minha expiação dos males, porque no verão às vezes também é preciso chover para hidratar a natureza... A verdade é que sinto que enquanto finjo que me aguento, que me vou aguentando realmente. Sinto que se me deixar cair que perderei o controlo e não sei quantos degraus, quantos metros me vou deixar cair, e assim vou continuando, aguentando, lutando contra o que sinto, contra o que me apetece e forçando-me a estar bem, nem que seja só pela via da força.
Bem sei que são fases, que todos nós passamos por momentos assim mas enquanto isso vou-me destruindo. Sãos os cigarros, uns atrás dos outros, é o cabelo que me continua a cair - que apesar de ter melhorado já voltou a piorar - são os quistos que me começam a aparecer em todo o lado. Sinto-me vulnerável e sinto que o meu corpo está a cair na teia, e no fundo é uma bola de neve.
Confesso que só me apetece fugir. Sair daqui, mudar de país, de cidade e até de nome, sei lá, qualquer coisa que me permitisse recomeçar, mas depois percebo que não iria resolver rigorosamente nada, a vida não é um filme por muito enrolada que às vezes possa parecer, a tábua rasa não existe, nem os resets à memória...
Eu que sempre fui tão resiliente sinto que me estou a perder... Perdi o meu orgulho, o meu amor próprio, a minha vontade de fazer coisas, de viver ativamente.
Sei que é só uma fase, mas sinto que esta fase está a durar mais do que desejo e não consigo perceber como ultrapassar e seguir com o mínimo de mazelas possível... Enquanto isso, luto contra mim, contrariando-me. Saindo quando não me apetece sair. Rindo quando me apetece chorar. Fingindo, essencialmente para mim, que vai ficar tudo bem, que sou forte e que tudo vai passar. De tanto fingir, pode ser que venha a acreditar.