Livro Secreto #7 As velas ardem até ao fim de Sándor Márai
E terminei de ler o sétimo livro do Livro Secreto de um autor que nunca tinha ouvido falar. Shame on me!
As velas ardem até ao fim de Sándor Márai é um livro pequeno de rápida leitura, facilmente leem numa tarde. Alguém já leu? Leiam, que verão que não se arrependerão.
Este livro é uma espécie de carta, quase um monólogo, sobre a amizade. Todo o livro é referente a uma conversa, a uma só conversa, entre o General Henrik e o seu amigo Konrád, que fugiu para os Trópicos, de um dia para o outro há 41 anos atrás, voltando agora velho à Hungria para resolver a sua situação com o amigo de outrora. Há um segredo que os une e que os separou, e o General, magoado e traído quer respostas a perguntas que se foram formulando ao longo desses 41 anos. O General é um homem magoado que nunca conseguiu ultrapassar o sucedido, que viveu para questionar Konrád, porque sabia que este um dia iria voltar. Qual será o segredo que os une? Como sobrevive uma amizade a 41 anos de mágoas? Leiam... E logo perceberão.
É um livro profundo, as palavras ligeiras que o compõe faz parecer um livro básico mas está longe de ser verdade. É um livro que é mais que uma história, é um livro carregado de significados, muito para lá da história. Apesar do segredo ser expectável, porque existem pistas que tornam o segredo óbvio logo no início do livro, isso não altera o interesse porque o que importa para o General Henrik não é perceber o que aconteceu e o porquê de ter acontecido, porque com o tempo aprendeu a relativizar as coisas e os sentimentos, ficando apenas uma grande agonia no coração. É um livro onde o personagem pretende desmontar os seus sentimentos enquanto busca um perdão, se isso for possível. Acho que é um livro que facilmente qualquer um de nós compreenderá e onde qualquer pessoa facilmente cria empatia com o personagem principal que monopoliza toda a conversa, porque todos nós já fomos traídos, todos nós - acredito eu - já sofremos devido a alguém que amamos. Basicamente é um livro onde o personagem principal pretende cortar o cordão umbilical com algo, para que depois possa seguir em frente e finalmente viver... Ou morrer!
O livro explora vários conceitos de amizade, ao ponto de questionar se a amizade verdadeira existe realmente, ao ponto de ser altruísta e não egoísta. Ou se por contrário somos amigos de quem nos convém, devido a um egoísmo inconsciente, na medida em que esperamos sempre algo em troca, nem que seja a própria amizade, o próprio amor, da outra parte. O autor defende que a verdadeira amizade não deve nunca esperar algo em troca, e que considera isso inatingível e por isso que amizade nesse conceito total e verdadeiro não existe.
Acima de tudo é um livro que mostra que nem sempre são as palavras que respondem a perguntas, que às vezes são os silêncios e a linguagem corporal que dão as melhores e mais verdadeiras respostas porque como o General indica:
O que vale a resposta que uma pessoa dá com palavras e não com a realidade da sua vida?... Vale pouco (...) São poucas as pessoas cujas palavras correspondem por completo à realidade das suas vidas. Talvez seja esse o fenómeno mais raro da vida.
- Que é que queres deste homem? – pergunta a ama.
- A verdade – disse o general.- Conheces bem a verdade.- Não conheço… É mesmo a verdade que não conheço.- Mas conheces a realidade – disse a ama numa voz aguda, ofensiva.- A realidade não é a verdade – retorquiu o general. – A realidade é apenas um pormenor.