Saltar para: Post [1], Comentários [2], Pesquisa e Arquivos [3]

Desabafos da Mula

Desabafos do quotidiano, por vezes irritados, por vezes enfadonhos, mas sempre desabafos.

Desabafos da Mula

O que custa é desfazer os laços

Quase trinta dias se passaram desde que vim para casa de um dia para o outro. Apesar de não contribuir ainda para as estatísticas, a verdade é que já estou mentalizada de que estou efetivamente desempregada, até porque esta situação não foi totalmente inesperada, apesar da forma como ocorreu sim. Foram meses e meses de perceção de que as coisas estavam muito mal, não foi de um ano para o outro. Se o primeiro ano da loja, foi um ano de boa faturação de muito movimento, de ano para ano as vendas foram descendo significativamente. Curioso como eu trabalhava com o turismo e como as vendas foram diminuindo à medida que o turismo aumentava na cidade.

 

A verdade é que as lojas de suvenires começaram a crescer como ervas daninhas, em excesso e descontroladamente, e por muito que se queira, os ovos não chegam para todos, porque não há assim tantas galinhas a pôr. Acho que aqui o estado deveria de pôr ordem. Há cafés porta sim, porta sim. Há cabeleireiros porta sim, porta sim. Há lojas de suvenires porta sim, porta sim. Há hostels, porta sim, porta sim. A concorrência é benéfica para os mercados, mas não pode ser assim, não deste jeito. Deveria de existir algum tipo de regulamentação.

 

Mas agora também pouco importa, já é tarde.

 

Há muito que as coisas estavam mal, e até pensava que a loja iria encerrar portas no ano passado. Se eu fosse patroa a loja tinha sido encerrada no ano passado. Mas pelo que percebo eu nunca poderia ser patroa... Tenho três coisa que pelos vistos os patrões não têm: coração, sensibilidade e bom senso. Mas adiante. Este ano só serviu para descer de faturação de 0, para -1, e cairmos em queda livre para o submundo da falência. Por isso, sim, não foi um choque quando o patrão disse "vou ter de fechar", e como tal não foi um choque não ter recebido aviso prévio. O aviso prévio foi chegando, com o decréscimo de vendas... Sou péssima a matemática, mas sei fazer contas de somar e subtrair. Foi o suficiente para perceber que mal dava para pagar a renda. Por isso não me custou muito a ideia de que iria ter de voltar a bater portas de currículo em punho, quando no início do mês de Dezembro fui mandada para casa.  Estava preparada para isso. Aliás, já estava à espera disso.

 

O que me entristece mais é a mudança brusca de rotinas, é a quebra total com os laços outrora criados. É os colegas que deixei de ver - "ah e tal ó Mula, mas podem continuar a ver-se!" Toda a gente sabe que não, que isso não vai acontecer - é as conversas com as meninas da frente que deixaram de existir, é o pequeno-almoço no café do costume, é... É toda uma rotina de três anos e meio que desaparece como se nunca tivesse existido. E isso sim, custa-me e entristece-me!

 

Odeio despedidas. Sempre odiei. Nunca fui ao meu último dia de trabalho, sempre faltei, mesmo quando me despedi por livre e espontânea vontade. É mau profissionalismo, bem sei. Mas odeio aquela sensação de, "ok é hoje, termina aqui!" vou ter de me despedir dos outros, vão existir abraços sentidos, beijos saudosos, e choraminguices. Odeio chorar em público. E tranquiliza-me sair de mansinho sem que ninguém perceba. Fico sempre com a sensação de quem nem deram, na realidade, pela minha falta.

 

Aqui, pela primeira vez, foi diferente. Aqui eu não fui e os outros ficaram. Aqui estávamos todos no mesmo barco, fomos todos embora, toda a gente se despediu com um até já e ninguém disse "tens de nos vir visitar!", a não ser as meninas da frente.

 

Sim, construir laços é fácil, leva tempo, mas é fácil... Difícil é puxar as fitas e os laços deixarem de o ser... Acho que nunca vou aprender a desenlaçar devidamente.

26 comentários

Comentar post

Pág. 1/2

Desabafos do quotidiano, por vezes irritados, por vezes enfadonhos, mas sempre desabafos. Mais do que um blog, são pedaços de uma vida.