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Desabafos da Mula

Desabafos do quotidiano, por vezes irritados, por vezes enfadonhos, mas sempre desabafos.

Desabafos da Mula

Quão fácil é julgar?

É muito fácil julgar o outro sem o conhecer realmente. Dizer uns quantos chavões e acreditar que se acertou numa vida inteira. Raramente se acerta, na realidade.

 

A vida tem me mostrado que o julgamento ao outro é quase inato à natureza humana. É incrível a facilidade com que nos permitimos avaliar as escolhas e comportamentos dos outros de modo automático, sem hesitar, como se de um reflexo se tratasse. Julgar é instintivo e fazemo-lo, todos nós sem exceção, de forma tantas vezes inconsciente.

 

Às vezes pergunto-me se não refletirá as nossas próprias inseguranças. Porque o ato de julgar oferece uma sensação momentânea de autoridade e controlo e por breves instantes podemos distrair-nos das nossas próprias imperfeições e fraquezas. Como que um alívio temporário da nossa dor e instabilidade.

 

Mas há todo um outro lado escuro, um outro lado que não se vê, que não se conhece. Quando olhamos de fora, sem conhecer as nuances da vidas e experiências dos outros, acabamos a reduzir os outros a simples rótulos superficiais. Acabamos reduzidos a rótulos simples e superficiais. Ignoramos histórias de vida, lutas silenciosas, desafios diários. Acabamos ignorados nas nossas lutas e feridas profundas. E é tão fácil apontarem-nos o dedo e dizerem-nos "é parvo sentires-te assim, porque eu já passei por pior e estou aqui". Não me interessa o pior dos outros, interessa-me o meu pior. Eu vivo a minha vida, sofro com os meus acontecimentos, e os outros com os seus. As feridas da alma podem ser tão ou mais nefastas que as físicas. Não há o bepanthene para a alma.

 

Em tempos, explicava a uma pessoa o motivo de um certo comportamento meu, que a pessoa em questão não entendia. A minha explicação foi reduzida a pó porque a pessoa dizia que eu não tinha o direito de me sentir assim e enumerou as suas razões pessoais. Confesso que no momento em que abri o meu coração e expliquei coisas que raramente me saem da boca - já a antever este tipo de comportamentos - que procurava compreensão, aceitação, empatia,... Mas o que encontrei foi palavras afiadas em vez de mimo. Atenção que não sou a favor que se deva colocar paninhos quentes nos outros, eu própria não o faço, e quem convive comigo sabe, mas senti-me totalmente nua perante um juiz implacável.

 

Rapidamente despi o juiz - não literalmente, infelizmente - e percebi que todo o ataque era, na realidade, defesa. Apesar de não ter encontrado empatia, senti empatia. A pessoa em questão luta com diabos internos bem mais agressivos do que os meus, é certo, e aquele pequeno diabo era na realidade uma criança assustada. Às vezes pergunto-me se deveria de ser tão compreensiva com a crueldade dos outros, mas rapidamente percebo que de outra forma os outros também não encontram suporte para poderem perder a capa e a armadura. E percebo que tantas vezes também sou esta pessoa dura que diz as palavras sem a consciência do quanto pode ferir. Na agressividade do outro vi a minha e percebi que é um comportamento que quero mudar em mim.

 

Afinal também podemos aprender algo certo com atitudes erradas...

Desabafos do quotidiano, por vezes irritados, por vezes enfadonhos, mas sempre desabafos. Mais do que um blog, são pedaços de uma vida.