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Desabafos da Mula

Desabafos do quotidiano, por vezes irritados, por vezes enfadonhos, mas sempre desabafos.

Desabafos da Mula

Quem conta um conto # 8 À tua espera!

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Ísis chegou à estação e lá estava ele, descontraído e sereno como sempre. Já o tinha visto outras vezes, mas desta vez sentiu algo diferente. Entravam sempre na mesma estação e tinham os dois o mesmo destino, mas quando saíam do comboio perdia-lhe o rasto. Julgou que trabalharia numa empresa perto, e por isso não percebia qual o seu real destino. Depois percebeu que era o passo apressado dele, o responsável por todo aquele mistério. Ísis sentiu, e apesar de terem trocado apenas uns breves olhares, que precisava de saber mais sobre ele. Aquela figura ensonada de jeans e óculos escuros matinais, que lhe escondiam os seus belos olhos verdes, suscitava-lhe curiosidade. 

 

"Estás a apaixonar-te". Diziam as suas amigas.

"Como seria isso possível? Eu nem o conheço..." retorquia.

 

A verdade é que todos os dias Ísis acelerava o seu passo para o seguir um pouco mais, mas o facto de nem sempre estarem na mesma carruagem lhe facilitava a tarefa. Ao fim de quase um mês percebeu que afinal estariam mais próximos do que julgava, descobriu afinal que o caminho que faziam todos os dias de manhã em direcção ao trabalho, era comum, e que apenas alguns minutos os separavam.

 

Não havia dia que não trocassem um olhar, e Ísis decidiu sorrir-lhe envergonhada. Quando ele lhe retribuiu calorosamente o sorriso, facilmente percebeu que a atracção era mútua, e que provavelmente ele seria tão envergonhado quanto ela. Passaram-se alguns meses e nada se alterou, a não ser a distância que os separava. Entravam diariamente para a mesma carruagem, sentavam-se frente-a-frente como se se conhecessem, e ficavam ali a olhar timidamente um para o outro, ela enquanto lia o seu livro que sempre a acompanhava, ele enquanto mexia no telemóvel para escolher uma outra música.

 

Com o inverno a terminar e com os primeiros raios de sol quentes a espreitarem pela janela do seu quarto, Ísis tomou uma decisão. "É hoje que perco a vergonha e lhe falo!", saiu decidida, vestiu a sua melhor roupa, calçou os seus melhores sapatos e maquilhou-se cuidadosamente para não parecer demasiado exagerado. Queria estar bonita, mas não exageradamente bonita. Atrasada, saiu de passo acelerado em direcção à estação, onde ele deveria estar, como sempre de olhar atento à sua espera. Mas nessa manhã, Ísis iria sozinha para o seu trabalho. Procurou-o com o seu olhar irrequieto, olhando para todo o lado e não o encontrou. "Deve ter-se atrasado..." pensou. Passou o seu dia desanimada e sentiu-se parva por toda aquela situação, como se o destino estivesse naquele preciso momento a conspirar contra si. Ísis deu por si a pensar no moço de jeans e olhos verdes e a sentir saudade. Percebeu então, que estranhamente estava apaixonada, ainda que fosse um sentimento que não explicava facilmente.

 

No dia seguinte, decidida, voltou a aperaltar-se novamente na esperança de o destino lhe reservar melhor sorte desta vez. Mas uma vez mais, ninguém apareceu. Dia após dia, Ísis tentava sem sucesso procurar os olhos verdes por quem se tinha apaixonado... 

 

Ísis continuou a apanhar o comboio, todos os dias, à mesma hora, na mesma estação, mas o moço de olhos verdes, nunca mais apareceu.

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Desabafos do quotidiano, por vezes irritados, por vezes enfadonhos, mas sempre desabafos. Mais do que um blog, são pedaços de uma vida.