Sobre a inocência
Vocês que me acompanham, vocês que de certa forma conhecem-me e têm um pedacinho de mim, sabem, já passei por algumas coisas nesta vida que me obrigaram a crescer, e a ser a mulher que sou hoje. Não me acho uma mulher inocente, até acho que sou bastante desconfiada, e bastante analítica e objetiva na vida. Não sou mulher de acreditar em milagres, ou em sonhos utópicos ou em realização de coisas impossíveis, ainda que não seja propriamente a melhor pessoa a aprender com os erros, que a minha teimosia mais do que tudo, obriga-me a insistir, a resistir e tantas vezes a pirar, mas ainda assim a minha cabeça permite-me ter, normalmente, os pés bem assentes na terra, por muito que o coração palpite por algo diferente. Quase sempre a cabeça leva a melhor. Vivo no plano do exequível, não no plano do sonho. É a minha forma de proteção, creio eu.
Ainda assim dou por mim tantas vezes a ter um lado inocente, onde me dispo de todos os pré-conceitos e de aprendizagens passadas e me atiro de cabeça com sonhos, com esperanças, com a crença de que é possível, de que tudo vai correr efetivamente bem como se dependesse exclusivamente de mim, da minha vontade. Mas a verdade é que nem sempre depende de nós, ou vá, nem sempre depende exclusivamente de nós e às vezes não sei se deveria de deixar, como deixo tantas vezes, este meu lado de menina e não de mulher, levar a melhor. Porque não, nem sempre fica tudo bem, nem sempre é possível, nem sempre há esperança, nem sempre há o que fazer e possibilidades de remediar.
E por isso apesar de ser mulher independente, dou por mim tantas vezes a ser menina carente. E por isso apesar de ser mulher com uma boa noção da realidade, dou por mim tantas vezes a ser menina que sonha e que planeia futuros num futuro, sem futuro. E por isso apesar de ser mulher maioritariamente de sangue frio, dou por mim tantas vezes a ser menina de emoções que chora por tudo e por nada. Dou por mim, a ter medo. Medo de falhar, quando tantas vezes não depende exclusivamente de mim, mas dou por mim a ser inocente ao ponto de carregar nos ombros as culpas e as falhas que nem sempre me pertencem realmente.
Sou humana, suponho que isto é ser humana. Às vezes gostava de ter um lado biónico. Programar o coração para o bom senso e para a moral, mas ter um lado biónico... ou capricónico, vá que isto de ser Carneiro dá demasiado trabalho.