Nem sempre é fácil colocar por palavras o que nos vais na alma. Nem sempre é fácil explicar o que sentimos porque tantas vezes nem nós realmente compreendemos. Não é fácil sentir, e por mais anos que viva acho que nunca irei compreender-me totalmente. Mas aceito-me assim! Acredito piamente que no meio da turbilhão de emoções que não compreendemos, importante é descobrir formas de extravasar, sejam elas exageradas ou não, sejam elas espelho inequívoco do que sentimos ou não, e a minha forma de tentar expor os meus pensamentos difusos é através de palavras, quase nunca em prosa, porque a prosa requer muito mais conhecimento de nós, requer muito mais maturidade emocional que a que tenho. Resta-me escrever em verso. Nestas alturas, resta-me escrever em verso. Restam-me as metáforas, as analogias, as rimas, tantas vezes confusas como só eu consigo ser.
Era uma vez...
Era uma vez um menino,
De olhar meigo, sorriso de criança,
Que fez apaixonar uma menina,
E dar-lhe à vida uma nova esperança.
Foram felizes um dia!
Ouviam-se as gargalhadas à beira mar.
E entre promessas e beijos,
Ali perceberam o que era amar.
Mas a maré um dia mudou,
E pela tempestade a menina foi apanhada.
Rebolou no mar, os joelhos esmurrou,
Pra bem longe da costa, a menina foi levada!
E era uma vez uma menina,
Que assustada pela vida, da felicidade fugiu.
Que de alma ferida, o seu coração não ouviu!
Perdeu o tino, a menina!
E aí a menina se apercebeu
Que por tudo o que é e fez, o menino perdeu,
Deixando apenas a lembrança,
Dos dias felizes, da cómoda segurança...
Quando a tempestade acalmou,
A menina, o menino tentou encontrar,
Mas de vestígios de quem amou,
Apenas vazio, no seu lugar!
Mas a menina, não desistiu. Procurou,
Por entre mato, destroços e dor,
Aquela chama de quem verdadeiramente amou,
Que não se apaga assim, quando é amor!
Dizem que aos lugares felizes não devemos voltar,
Que apenas encontramos vazio e indiferença,
Mas enquanto uma ténue e fraca chama brilhar,
Vale a pena, manter a fiel crença!
E assim a menina reencontrou a esperança,
E o coração do menino tentou reanimar,
E para sabermos como termina a história,
Em nós, os meninos de outrora teremos de encontrar!
Já há muito tempo que não entrava no túnel, e que não ouvia as pessoas lá ao fundo, como se estivessem longe de mim. Já há muito tempo que caminhava sóbria em casa, nos restaurantes, nas ruas... Mas no fim-de-semana foi diferente, e o problema que me assaltava na infância voltou a assaltar-me novamente.
Os médicos nunca me souberam compreender, ou eu é que nunca me consegui explicar, mas o túnel às vezes encerra-me em si e eu fico distante e sinto-me distante, tão distante como se não me conseguissem tocar.
"É como se de repente estivesse a sonhar e conseguisse olhar as pessoas de fora do meu círculo" foi o que sempre comuniquei aos xôs doutôres que me analisavam e que me tentaram escarafunchar a mente como se de uma cobaia se tratasse. Após dois ou três encefalogramas e outras tantas análises, nada de errado eu tinha, e os médicos foram desvalorizando, como se fosse só uma criança carente de atenção. Mas eu continuava a entrar no túnel e no sonho aparente, e continuava-me a queixar, até que os médicos convenceram a mãe a deixar de trabalhar que isto era "falta da mãe" diziam! Talvez tivessem razão. E com a presença mais assídua da mãe, deixei, por vários anos de entrar nesse túnel que me sugava a alma e a deixava fora do meu corpo. E durante anos apenas permaneceu a lembrança desses tempos, dos tempos em que eu deixava de agir, e ouvia os outros à minha volta a falarem, sem que eu conseguisse interagir, com aquela sensação de que se quer correr mas o corpo não corresponde ao pedido da mente.
Mas parece que não se pode fugir para sempre desse estranho túnel inexplicável, e no fim-de-semana, voltei a entrar nesse túnel. No meio de uma multidão, de um barulho ensurdecedor, voltei a ver as pessoas a passarem por mim mais rápido do que realmente andavam, mais longe do que realmente estavam, e inexplicavelmente consegui encontrar o silêncio dentro de mim como se a música tivesse simplesmente parado. Tentei, em vão que a minha alma reentrasse no corpo e que voltássemos a ser um só, mas só quando por fim encontrei o silêncio, um silêncio real e não adulterado é que me reencontrei comigo mesma, e voltei a ser eu, alma, ouvidos e visão normal.
Muitos acharão que nessa noite bebi mais do que a conta, a sensação é realmente a mesma, mas os meus lábios não tocaram em álcool, a não ser que a coca-cola tivesse sido adulterada à lata fechada, e assim após tantos anos de descanso, deixo novamente de conseguir estar em locais com demasiada gente e barulhentos sem que me perca por entre as gentes e me veja do lado de fora, como se de um sonho se tratasse.
Acho que ainda hoje não consigo explicar verdadeiramente o que me acontece nesses breves minutos no túnel.